É JA PERDI A CONTA DOS AMORES E EMPREGOS OUE DEIXEI ESCAPAR POR NAO SABER DEMONSTRAR SENTIMENTOS.
(quando não gozavam). Aliás, porfalarem gozo, minha primeira vez não foi um completo desastre porque não lembro direito o que aconteceu. Quando percebi que o carinha que eu achava um deus estava a fim, fiquei tão nervosa que entornei três doses de vodca com energético e... apaguei! Bons momentos na cama, tive alguns, não vou negar. Principalmente com caras que acham minha inibição sexy. Esses não caem matando, mas estão crentes de que só faço gênero. O namoro não dura porque esperam retribuição: que eu me solte, o que é impossível antes de uns seis meses.
MINHA MELHOR amiga, a Di, já cansou de repetir que não há motivo para eu ser tão insegura com os homens e com a minha aparência. Não sou gostosa como a Halle Berry. mas tenho lá meus encantos. Uma coisa é saber, outra é acreditar.
PIOR É QUE tudo que os outros fazem com a maior naturalidade vira tortura para mim. Um exemplo? Celular. Tenho um por causa do trabalho—dou aulas particulares de inglês para crianças—, mas considero tal engenhoca uma máquina infernal, inventada com o diabólico objetivo de tocar em horas e locais impróprios, constrangendo quem tem horror de chamar a atenção. Ponho sempre para vibrar, pois musiquinha estridente me mata de vergonha caso alguém ouça. De fato, o sonho de qualquer tímido é passar despercebido, exatamente porque já existe a sensação de que está todo mundo de olho, só esperando a primeira besteira ou vexame. Nas raras vezes em que não consigo escapar de uma festa num lugar estranho, ao chegar já localizo o banheiro e fico por perto. É um ótimo lugar para se esconder e... tem pior mico que atravessar uma sala lotada de desconhecidos, se equilibrando no salto e anunciando ao povo que está doida pra fazer xixi?
A PREOCUPAÇÃO com o ridículo é constante na vida de uma tímida. Aliás, a coisa mais comum do mundo é a gente ser mal interpretada. Culpa nossa, evidentemente, que quase nunca abrimos a boca para emitir opiniões e temos dificuldade para encarar os outros. Sei de gente que, por causa disso, me acha um nojo, metida a besta. Quando me conheceu, o namorado da Di achou que das duas uma: ou eu era tolinha ou sapatão. Ele mesmo me contou depois, para me dar um toque de como a inibição pode confundir a imagem de uma "garota tão gente fina".
E EU NÃO SEI?Já perdi a conta dos relacionamentos e empregos que deixei escapar por total bloqueio para demonstrar meus sentimentos e talentos. Não foi por falta de tentar. Leio tudo que aparece sobre timidez. Descobri, por exemplo, que, apesar da sensação de solidão que aflige toda criatura acanhada, não estamos sozinhas: pesquisadores garantem que metade da população do planeta é assim. Fiquei sabendo também que bebês expostos a súbitos barulhos intensos crescem introvertidos, mas mamãe jura que meu berço era um mar de tranqüilidade e eu tinha até um mobile que tocava Bach e Mozart TAMBÉM NÃO fui abusada, nem criticada, nem negligenciada na infância. De modo que não descubro no passado a ponta do fio dessa meada. Certeza, só uma: vou ficar ainda mais enrolada no futuro se não melhorar agora. Uma das sugestões dos especialistas é uma automedicação estilo mantra. Ficar repetindo pensamentos positivos do tipo "Barbra Streisand também era um poço de timidez e meu nariz é bem menor que o dela", "Deixa de ser pretensiosa, os outros têm mais o que fazer do que ficar prestando atenção em você". Dizia o dr. Emile Coué. um francês que inventou essa técnica de auto-hipnose em meados do século 19, que o que afirmamos com insistência acaba virando verdade na nossa cabeça. Tomara.
PELO SIM, pelo não. tenho treinado outro truque simples: fazer caras e bocas na frente do espelho. A idéia é treinarexpressões de alegria, interesse etc. e tal para usar naquelas ocasiões sociais que nos deixam catatônicas, ' parecendo burras, metidas... E topei contar a NOVA alguns dos meus dissabores, como parte do tratamento de choque. É tudo verdade, menos o nome que estou assinando. Esperar esse tipo de coragem de uma tímida é pedir demais, não acha?
